sábado, 15 de janeiro de 2011

Invasão é mesmo a solução?

Segue um texto que discute a questao de moradias na Cidade de São Paulo... pra variar, destoa de tudo o que estamos acostumados a ler, ver e ouvir.


por João Carlos Belda em 6 de janeiro de 2011 Opinião - BrasilOfim de ano foi pródigo para o debate sobre habitação em São Paulo. Começou com a agitação da reintegração de posse de prédios ocupados pela Frente de Luta por Moradia e terminou com a divulgação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) do número de imóveis vazios na capital paulista. São 290 mil.
Li numa revista que 290 mil é um número muito maior do que o de famílias sem-teto, que, na conta do jornalista, seriam 130 mil. As reportagens que se seguiram à divulgação da pesquisa mais pareciam clamores públicos pelos que vivem em situação precária na cidade. Até aí, sem novidades.
 
O paralelo com os militantes sem-teto que mantêm edifícios ocupados era inevitável.
 
Como a Justiça pode ser tão insensível, autorizando a reintegração de posse desses prédios, diante do desperdício de 290 mil imóveis vazios? Como ainda consegue tratar os sem-teto como criminosos? –  bradava um dos artigos. O leitor que me acompanha sabe que não me conformo em ler reportagens. Fazer um Google sobre o assunto e ler tudo o que encontrar é quase uma obsessão. E após o terceiro arquivo pesquisado  foi fácil chegar à conclusão de que essa discussão é falsa: sobram meias verdades nesse debate, interpretação errada de dados e manipulação política.
 
Já dizia um amigo economista  que os números, sob tortura, dizem o que queremos ouvir. Penso que o afã de resgatar a imensa dívida social que o País tem, após anos de crescimento econômico sem distribuição de renda, tem nos deixado um tanto cegos. Falta bom senso à era do "nunca-antes-na-história-desse-país".
 
Primeiramente, descobri que não é absurdo uma cidade com quase 4 milhões de domicílios ter 290 mil imóveis vagos.
 
A proporção é pouco superior a 7% e se encaixa num conceito que os técnicos da área chamam de "vacância de equilíbrio",  período  que o local fica vazio entre uma transação e outra.
 
Sem isso, a cidade perderia a dinâmica natural. Por exemplo: esse porcentual, em Nova York,  é de 6%!
 
Consultei uma pesquisa feita recentemente pela USP para a Cohab-SP e fiquei  mais espantado. O estudo identificou 53 edifícios ociosos no centro de São Paulo – e não centenas – que podem ser convertidos em moradia.
 
Numa atitude inédita, a Prefeitura resolveu arregaçar as mangas e desapropriar todos. Decidiu também instituir o IPTU progressivo, que dobrará o valor da alíquota do tributo dos imóveis ociosos até atingir 15% do valor venal da propriedade.
 
Mas nada me deixou mais espantado do que algumas verdades descobertas nesse estudo, informações convenientemente esquecidas por lideranças de sem-teto e acadêmicos. Entre as principais , que o Centro não é tão ocioso quanto dizem. E os proprietários desses imóveis não são grandes devedores de IPTU como se propaga. Apenas dois  devem quantias consideráveis, que não chegam a 30% do valor do prédio. Há quem deva R$ 1.500.
 
Em minha pesquisa descobri outras meias-verdades: o déficit de moradia de São Paulo não é de 130 mil famílias. Esse número diz respeito àquelas que vivem em área de risco, segundo o Plano Municipal de Habitação (PMH). O número das que vivem de forma inadequada na cidade chega a 800 mil famílias:  inadequações das mais variadas, como viver em favela ou pagar aluguel acima da capacidade financeira.
A partir daí, é difícil continuar acreditando nessas pseudoanálises. Não é verdade, por exemplo, que os sem-teto sejam tratados como se fossem criminosos. Reintegração de posse é uma ação sofrida até por empresas, quando há divergência sobre os limites de uma propriedade. Eles invadiram o prédio e o proprietário defendeu o seu direito.
 
Passei o mês de dezembro assistindo ao drama dos sem-teto da FLM, em incontáveis reportagens de jornal e vídeos dramáticos na TV. Não identifiquei  menção a nenhum proprietário que, independentemente de qualquer coisa, acordou com  sua propriedade ocupada. Alguém já se imaginou nessa situação? Afinal, vivemos ou não um Estado de direito? Temos ou não direito à propriedade privada?
 
O mais lamentável, no entanto, foi constatar que ninguém, nessas reportagens, estava interessado em discutir os graves problemas habitacionais que São Paulo enfrenta e que, infelizmente, não são exclusivos dos militantes da FLM. Li de uma especialista que as invasões são úteis para chamar atenção ao déficit habitacional. Discordo. Útil seria debater o Plano Municipal de Habitação, o que fazem muitos outros movimentos de moradia paulistanos que não têm a invasão como prática.
 
Concluí que a invasão é útil, sim, mas para a Frente de Luta por Moradia. Entre os ocupantes dos prédios, havia famílias que já recebiam o auxílio aluguel da Prefeitura, de R$ 300 mensais.
 
Após a movimentação, que incluiu até acampamento na frente da Câmara Municipal, de onde se alardeava a existência de 1.000 famílias e onde não víamos mais de 15 pessoas quando a imprensa não estava no local, mais 111 foram beneficiadas com o auxílio aluguel.
 
Soube que quase 1.400 famílias inscritas na FLM recebem o benefício. Se fosse obrigatório ao militante a "devolução" de um aluguel por ano ao movimento, a Frente embolsaria R$ 420 mil numa tacada só. Quem faz a contabilidade dos sem-teto? Há transparência na prestação de contas? Do que vivem os líderes?
 
A única imagem que não me sai da cabeça é daquela senhora da periferia, que trabalha duro para pagar o aluguel do quarto-e-cozinha e manter a família. Como não pertence à FLM nem invade propriedade alheia, não tem esses R$ 300 para aliviar o mês. Que essa imagem fique para a sua reflexão, leitor.
 

2 comentários:

  1. É deprimente ver uma pessoa que se diz religiosa assumir esse vil papel de disseminador do ódio. Como aceitam isso na sua Igreja? Tenho certeza que o pessoal lá não bate palmas pras asneiras que você diz. Conheço muitos protestantes decentes e fico feliz em saber que você é minoria.

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  2. O ódio foi disseminado em que lugar?

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